26 janeiro, 2006

Preciso me Encontrar





Preciso me Encontrar
Interprete: Cartola
Composição: Candeia

Deixe-me ir preciso andar,
Vou por aí a procurar,
Sorrir pra não chorar
Deixe-me ir preciso andar,
Vou por aí a procurar,
Sorrir pra não chorar

Quero assistir ao sol nascer,
Ver as águas dos rios correr,
Ouvir os pássaros cantar,
Eu quero nascer, quero viver

Deixe-me ir preciso andar,
Vou por aí a procurar,
Sorrir pra não chorar
Se alguém por mim perguntar,
Diga que eu só vou voltar
Depois que me encontrar

Quero assistir ao sol nascer,
Ver as águas dos rios correr,
Ouvir os pássaros cantar,
Eu quero nascer, quero viver

Deixe-me ir preciso andar,
Vou por aí a procurar,
Sorrir pra não chorar
Deixe-me ir preciso andar,
Vou por aí a procurar,
Sorrir pra não chorar
Deixe-me ir preciso andar,
Vou por aí a procurar,
Sorrir pra não chorar

12 janeiro, 2006

Senhas







Eu não gosto do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto de bons modos
Não gosto

Eu aguento até rigores
Eu não tenho pena dos traídos
Eu hospedo infratores e banidos
Eu respeito conveniências
Eu não ligo pra conchavos
Eu suporto aparências
Eu não gosto de maus tratos

Mas o que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto de bons modos
Não gosto

Eu aguento até os modernos
E seus segundos cadernos
Eu aguento até os caretas
E suas verdades perfeitas

O que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto de bom senso
Eu não gosto de bons modos
Não gosto

Eu aguento até os estetas
Eu não julgo a competência
Eu não ligo para etiqueta
Eu aplaudo rebeldias
Eu respeito tiranias
Eu compreendo piedades
Eu não condeno mentiras
Eu não condeno vaidades

O que eu não gosto é do bom gosto
Eu não gosto do bom senso
Eu não gosto de bons modos
Não gosto

Eu gosto dos que têm fome
Dos que morrem de vontade
Dos que secam de desejo
Dos que ardem…

07 janeiro, 2006

O Ultimo Discurso






Sinto muito,
mas não pretendo ser um imperador.
Não é esse o meu ofício.
Não pretendo governar ou conquistar
quem quer que seja.
Gostaria de ajudar se possível
judeus, o gentio... negros... brancos.

Todos nós desejamos ajudar uns aos outros.
Os seres humanos são assim.
Desejamos viver para a felicidade do próximo
não para o seu infortúnio.
Por que havemos de odiar
e desprezar uns aos outros?
Neste mundo há espaço para todos.
A terra, que é boa e rica,
pode prover a todas as nossas necessidades.

O caminho da vida pode ser
o da liberdade e da beleza,
porém nos extraviamos.
A cobiça envenenou a alma dos homens...
levantou no mundo as muralhas do ódio...
e tem-nos feito marchar a passo
de ganso para a miséria e os morticínios.
Criamos a época da velocidade,
mas nos sentimos enclausurados dentro dela.
A máquina, que produz abundância,
tem-nos deixado em penúria.
Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos;
nossa inteligência, empedernidos e cruéis.
Pensamos em demasia e sentimos bem pouco.
Mais do que de máquinas,
precisamos de humanidade.
Mais do que de inteligência,
precisamos de afeição e doçura.
Sem essas virtudes, a vida será de
violência e tudo será perdido.

A aviação e o rádio
aproximaram-nos muito mais.
Ä própria natureza dessas coisas
é um apelo eloqüente à bondade do homem...
um apelo à fraternidade universal...
à união de todos nós.
Neste mesmo instante a minha voz
chega a milhares de pessoas pelo mundo afora...
milhões de desesperados, homens,
mulheres, criancinhas...
vítimas de um sistema que tortura
seres humanos e encarcera inocentes.

Aos que me podem ouvir eu digo:
“Não desespereis! A desgraça
que tem caído sobre nós
não é mais do que o produto
da cobiça em agonia...
da amargura de homens que temem o avanço
do progresso humano.
Os homens que odeiam desaparecerão,
os ditadores sucumbem e o poder
que do povo arrebataram
há de retornar ao povo.
E assim, enquanto morrem homens,
a liberdade nunca perecerá.

Soldados!
Não vos entregueis a esses brutais...
que vos desprezam...
que vos escravizam...
que arregimentam as vossas vidas...
que ditam os vossos atos, as vossas
idéias e os vossos sentimentos!
que vos fazem marchar no mesmo passo,
que vos submetem a uma alimentação regrada,
que vos tratam como gado humano
e que vos utilizam como bucha de canhão!

Não sois máquina!
Homens é que sois!
E com o amor da humanidade em vossas almas!

Não odieis!
Só odeiam os que não se fazem amar...
os que não se fazem amar e os inumanos!

Soldados!
Não batalheis pela escravidão!
Lutai pela liberdade!

No décimo sétimo capítulo de São Lucas
está escrito que o Reino de Deus
está dentro do homem
não de um só homem ou grupo de homens,
mas dos homens todos!

Está em vós!
Vós, o povo, tendes o poder;
O poder de criar máquinas.
O poder de criar felicidade!

Vós, o povo,
tendes o poder de tornar esta vida livre e bela...
de faze-la uma aventura maravilhosa.

Portanto, em nome da democracia
usemos desse poder,
unamo-nos todos nós.
Lutemos por um mundo novo...
um mundo bom que a todos
assegure o ensejo de trabalho,
que dê futuro à mocidade
e segurança à velhice.

É pela promessa de tais coisas
que desalmados têm subido ao poder.
Mas, só mistificam!
Não cumprem o que prometem.
Jamais o cumprirão!

Os ditadores liberam-se,
porém escravizam o povo.
Lutemos agora para libertar o mundo,
abater as fronteiras nacionais,
dar fim à ganância,
ao ódio e à prepotência.

Lutemos por um mundo de razão,
um mundo em que a ciência e o progresso
conduzam à ventura de todos nós.

Soldados,
em nome da democracia, unamo-nos!

Hannah,
estás me ouvindo? Onde te encontrares,
levanta os olhos! Vês, Hannah?

O sol vai rompendo as nuvens que se dispersam!
Estamos saindo da treva para a luz!
Vamos entrando num mundo novo
um mundo melhor,
em que os homens estarão acima da cobiça,
do ódio e da brutalidade.

Ergue os olhos, Hannah!
A alma do homem ganhou asas e afinal começa a voar.
Voa para o arco-íris,
para a luz da esperança.

Ergue os olhos, Hannah!
Ergue os olhos!

02 janeiro, 2006

Navegar é Preciso



Fernando Pessoa


"Navegadores antigos
tinham uma frase gloriosa:
Navegar é preciso; viver não é preciso

Quero para mim o espírito desta frase,
transformada a forma
para a casar como eu sou;

Viver não é necessário;
o que é necessário é criar;
Não conto gozar a minha vida;
nem

em gozá-la penso.
Só quero torná-la grande,
ainda que para isso tenha
de ser o meu corpo e
a (minha alma) a lenha desse fogo.

Só quero torná-la
de toda a humanidade;
ainda que para isso
tenha de a perder como minha.
Cada vez mais assim penso.

Cada vez mais ponho da essência
anímica do meu sangue
o propósito impessoal
de engrandecer a pátria
e contribuir
para a evolução da humanidade.

É a forma que em mim
tomou o misticismo da nossa Raça.
---

Nota:
Navigare necesse; vivere non est necesse
latim, frase de Pompeu, general romano, 106-48 aC.,
dita aos marinheiros, amedrontados, que recusavam
viajar durante a guerra, cf. Plutarco, in Vida de Pompeu